Penso que delicadeza deveria ser um atributo essencial na contratação de qualquer profissional. A fala dela, porém, torna-se gravíssima quando o profissional tem, por ofício, atender ao público, responder pela boa imagem de uma empresa, tratar da comunicação.
Nesse particular, Josep Carreras é imbatível; um verdadeiro príncipe, na verdade - e de berço. Esse traço seu decerto o acompanha há vidas e vidas, e nesta, especificamente, pude testemunhá-lo nas mais diversas ocasiões.
Por isso mesmo, não entendo o fato de a delicadeza não imperar entre algumas pessoas que trabalham para ele e têm a seu cargo zelar por um bem muito precioso: a vida humana.
Minha recente tentativa de visita à Fundação Internacional Josep Carreras para a Luta contra a Leucemia constituiu-se numa tremenda decepção - que aos poucos transformou-se, mesmo, em indignação.
Lembro-me de que, há alguns anos atrás, quando a sede da fundação ainda ficava na Carrer Roger de Lluria, minha amiga Flávia esteve lá, para levar uma lembrança para Josep em meu nome. E foi muitíssimo bem recebida! Até me mandaram o então recém-lançado livro de culinária e ópera de Carreras.
Em maio passado, estive na cidade e, dentro dos cânones do politicamente correto, enviei um email à Comunicação da Fundação, no qual me identificava e solicitava que me recebessem. A visita de cortesia tinha por finalidade atualizar-me quanto às recentes atuações da Fundação, para que, na medida das minhas possibilidades, ajudasse a divulgá-las, coisa que aliás tenho feito a vida toda.
Não tive resposta alguma, mas minha grande amiga Carme Pujol, ela mesma jornalista e catalã, sugeriu que déssemos uma chegada lá. E assim fizemos. À porta, uma jovem senhora nos interpelou em tom cortante: "O que querem?". Procurei explicar educadamente, mas o segundo corte não me esperou concluir: "Não podem vir aqui sem ligar antes, já estamos de saída!" Ponderei que havia feito contato mas não obtive resposta. "Não posso fazer nada. Vou sair agora. Tem que ligar para Alessandra amanhã. Ela não respondeu porque estava viajando." E assim se encerrou o breve colóquio, a senhora com a porta quase na nossa cara e nenhum sorriso. Carme, escandalizada, me pediu desculpas em sentido pátrio. Claro está que aquela simpatia toda não combinava com nada do que até então tinha recebido da Catalunya de Josep; relaxei e, mesmo sem muita vontade, comprometi-me comigo mesma a ligar no dia seguinte.
Mal me identifiquei ao telefone, a indicada Alessandra - ao que parece, responsável pela Comunicação da Fundação - me interpelou apressada. "Sim, minha colega me comentou. O que deseja?" Repeti a mesma intenção: disse que conhecia Josep há muito tempo e que queria visitar a Fundação, para ter mais informações e ajudar a disseminá-las. Sem mudar o tom, disse: "Bem, se quiser, pode vir... mas não venha muito tarde. Pelas quatro horas é melhor. Mas já vou avisando que sou muito ocupada e que não tenho muito tempo."
Convenhamos: se a ocupação de um profissional de Comunicação é atender a imprensa, não vejo em que aspecto o fato de me atender estaria fora de suas atribuições. Se uma pessoa dessas responde pela Comunicação de uma organização que existe para atender à vida humana e para valorizá-la, não pode se comportar como uma funcionária pública ligada no piloto automático e não tem o direito de ser grosseira ou fazer com que o visitante se sinta indesejável. Há coisas que simplesmente não batem.
Após desligar, ponderei se deveria ou não me dar ao trabalho de retornar. Apesar das minhas melhores intenções e de todo o respeito que tenho, sempre tive e terei pela obra de Josep na luta contra a leucemia, cheguei à conclusão que não valia a pena. E, em nome deste mesmo respeito, devo dizer que a organização precisa se reavaliar nesse aspecto do relacionamento com o mundo externo: não há como alguém acreditar efetivamente nela se a voz que fala em seu nome passa essa imagem de arrogância e desinteresse em saber o que aquela pessoa - que nesse caso fui eu, mas poderia ser alguém muito mais importante - teria ou não a acrescentar ou oferecer.
Não pude deixar de me lembrar de um momento na vida em que senti, muito fortemente, a presença da verdadeira humanidade. Foi no Instituto Nacional do Câncer, em 2006, justamente na visita de Josep Carreras. Aliás, até já falei nisso por aqui. Sentada numa sala de espera cheia de pacientes, pude testemunhar o carinho, a dedicação e a educação que todas as enfermeiras, sem exceção, nos dispensavam - a nós e aos pacientes que esperavam para cumprimentar o tenor. Não havia, ali, qualquer pessoa "ocupada demais" para dar atenção a quem precisava ou a quem observava; todas sabiam exatamente qual era o seu papel no mundo e se entregavam totalmente a ele. Algo muito além do salário, do horário de entrada e saída, de qualquer formalidade. E lamentei, sinceramente, que Josep não tenha conseguido isso na sua tão querida Fundação, apesar de todo o seu empenho e exemplo.
sábado, 18 de julho de 2009
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