quinta-feira, 24 de abril de 2008

Curitiba, você é assim...


Ópera de Arame - Curitiba, Paraná
Foto: Luis Toporowicz

Curitiba, você é assim,
a certeza de um amor sem fim!
De qualquer parte do mundo,
um abraço, uma canção
- um povo, um só coração!

(Trecho do Hino dos 300 anos de Curitiba)


Passar 12, 13 horas num ônibus, em 1993, era moleza. Hoje não garanto que teria tanto fôlego, mas... o fato é que saí de Barra Mansa às sete e meia da noite de uma quinta-feira, no início de abril, num amarelinho da Itapemirim e feliz da vida. Meu destino era Curitiba, onde aconteceria o primeiro concerto de Josep Carreras no Brasil.
Viajei na véspera da privatização da CSN, onde trabalhava, deixando para trás a ansiedade coletiva que cercava aquele fato histórico e passei a noite na estrada, confabulando com minha própria ansiedade pelo instante de viver, em minha terra, uma alegria pelo menos parecida com a de dois anos antes, em Buenos Aires, quando conheci Carreras.
Assim que soube da notícia de que ele viria ao Brasil para protagonizar aquele que seria o histórico Concerto de Curitiba, quis saber de quem tinha sido a idéia. E descobri que tudo aconteceria por obra e graça do prefeito da cidade, Rafael Greca, um assumido fã de Josep Carreras. Taí alguém que já admiro sem conhecer, pensei. Por gostar do Carreras e pela coragem de trazê-lo!
Logo escrevi para ele, com meu entusiasmo e minha pequena história de devoção. Pois não é que o prefeito respondeu e me credenciou como jornalista para cobrir o evento? Radiante, fiz as malas e os melhores planos, junto com minha amiga Fátima, que seguiria do Rio e me encontraria em Curitiba.
Hospedamo-nos no Araucária Flat, um apart novinho onde ficariam também Josep Carreras e toda a comitiva do evento. Urgia não perder nenhum detalhe...
Ao chegar, às seis da manhã, mais surpresas da prefeitura me aguardavam: havia uma reserva em meu nome no hotel destinado aos jornalistas, que gentimente declinei, além de transporte para a entrevista coletiva, que aconteceria pouco depois na Ópera de Arame, bem ao lado do palco da festa, a magnífica Pedreira Paulo Leminski. No ônibus dos jornalistas pude constatar o peso das feras que teria ao meu lado naqueles memoráveis dias: Zuenir e Mary Ventura, Mary Galanternik, o grande crítico de música Luiz Paulo Horta, José Carlos Barbosa e uns tantos mais, todos muito agradáveis desde o primeiro momento.
Na Ópera de Arame, sobre um tablado, cadeiras bem posicionadas para que os jornalistas tivessem uma boa visão da mesa dos entrevistados. O tempo um pouco cinzento, mas nada frio. Acomodo-me na segunda ou terceira fila. Logo a seguir chegam Josep Carreras, o maestro Enrique Ricci e os organizadores do evento: Miriam Dauelsberg, pela Dell'Arte, e a Secretária de Cultura, Scylla Schulman, além do Prefeito Rafael Greca e sua esposa, uma autêntica catalã.
Quando estava prestes a sentar-se, Carreras me viu e cumprimentou-me. Ao retribuir a distinção, quase paguei o maior mico da história do Concerto de Curitiba: pelos desígnios imprevisíveis da Lei de Murphy, o pé direito traseiro da minha cadeira de ferro entrou inteiro num buraco do tablado!
Segundos de quase pânico, o desequilíbrio a crescer... e, por sorte, uma idéia rápida e feliz: apoiei a mão direita no chão e, com isso, evitei a queda praticamente certa. Recomposta a cadeira, tudo transcorreu na mais perfeita ordem; participei normalmente da coletiva, fiz minhas perguntas e tudo o mais.
Perto do final do evento, percebi um leve toque em meu ombro esquerdo, e uma voz inconfundível quase a segredar-me: - Olha, eu vi o que aconteceu com a sua cadeira. Se não tivesse visto, podia até dizer que foi de emoção porque o homem falou com você!
Era Zuenir Ventura, com seu adorável sorriso brincalhão. Daí em diante foi festa.
Depois descemos todos para visitar os jardins da Ópera de Arame, onde Carreras iria inaugurar uma placa marcando sua passagem - tudo muito bonito e bem organizado, com direito a um simpático brunch. No balcão encontrei o maestro Enrique Ricci, sempre sorridente e afável. Cumprimentamo-nos e observei que havíamos nos cruzado uma vez em Buenos Aires, dois anos antes. - Lembro-me perfeitamente desse dia - respondeu, com segurança e simpatia. - Estávamos no Hotel Plaza e fui eu que a anunciei ao Josep, quando subi - completou. Que memória, pensei com meus botões. A partir daí, e nos dias que se seguiriam, firmamos uma amizade que, ao longo de tantos anos, só tem sido motivo de alegria.
Mais tarde, quando eu e Fátima rumávamos aflitas para o ensaio, demos com duas moças - fãs do Carreras - que estavam a caminho do hotel para nos procurar, por indicação de um conhecido de Fátima. Falamos muito rapidamente, eu cheia de cuidados em não denunciar o nosso destino naquele momento. Mais de um ano depois, uma delas, Carmem, voltaria por outros caminhos e tornar-se-ia uma das minhas melhores amigas, Carreras à parte. Mas isso é outra história...


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